terça-feira, 11 de setembro de 2012

Paulo Oliveira assume que colaborou no assassinato

Caso do assassinato do ex-SG da Renamo, Evo Fernandes
 
“(...) A lenda de uma ligação ao major-general Bonifácio Gruveta e à linha pacifista dentro da Frelimo(...)”, o jantar fatal e revelações do SNASP na Beira
(Maputo) O autor de «Renamo: uma descida ao coração das trevas» confessa ter prestado informações ao «SNASP-Serviço Nacional de Segurança Popular» no âmbito da operação destinada a pôr termo à vida do antigo secretário-geral do movimento de Afonso Dhlakama. Paulo Oliveira refere no seu livro de memórias que no dia anterior à morte de Evo Fernandes, o SNASP lhe havia perguntado se era hábito do ex-secretário-geral da Renamo andar armado.
Eis o que Oliveira escreve no seu livro (N.E.: o indivíduo de nome Ruque a seguir citado era funcionário do SNASP): “Estamos a 17 de Abril, domingo. Outro domingo, outro 17 de Abril, precisamente cinco anos sobre a data da morte do Orlando Cristina. E perfazem-se 33 dias após o meu regresso a Moçambique. O sábado fora quebrado na sua rotina apenas com a passagem precipitada, fugaz, do Ruque. Duas ou três perguntas mais para o dossier. Uma delas: «E lá em Lisboa, o Evo, costuma andar armado? Com quê?»
- Que me lembre... só se for com revólver .32 oferecido pelo Brigadeiro Charlie Van Niekerk numa das visitas a Lisboa.«Okay» e era tudo, por esse lado.
O domingo, por ali, pelo menos em Maputo, nada de novo traria. No dia seguinte contudo começam a surgir notícias sobre o desaparecimento em Lisboa do Evo Fernandes.”
O autor material do crime
Referindo-se a Alexandre Xavier Chagas, o autor de «Renamo: uma descida ao coração das trevas” conta a páginas 332-333: “Até o próprio Evo Fernandes tivera já diversos contactos com um grupo encabeçado por um tal Alexandre Xavier Chagas.
[...] Venderam ao Evo em finais de 1987 e início de «88, a lenda de uma ligação ao major-general Bonifácio Gruveta e à linha pacifista dentro da Frelimo. Tentar-se-ia uma reunião mais abrangente, diziam, no futuro próximo, para perto de Évora, com mais gente da Renamo, etc. e tal. Mas para já, em Abril de 1988, o Chagas telefona ao Evo e combinam um jantar no conhecido Beira-Mar em Cascais, junto à Rua Direita, de onde iriam depois, diz o Chagas matreiro, a um encontro com o Gruveta. [...] Uma vez a comezaina terminada entram num Citroen DS conduzido por um tal Messias e ainda na companhia de um outro acólito do Chagas. Em resumo, o corpo baleado, seria descoberto lá para os lados de Sintra e da Malveira da Serra, poucos metros distanciados da estrada, meio coberto pela gabardina, capuz sobre a cabeça. Segundo se apurou, os disparos, seis, foram todos feitos dentro da viatura, pelo próprio Chagas. [...]
Quem conta as linhas acima refere outra versão da história: que nem todos os disparos foram feitos dentro do carro, que Evo Fernandes foi levado a um barracão e torturado, espancado e «violado» com um bastão ou pau de vassoura. Confirma-me o extremo sadismo de Alexandre Xavier Chagas posto em tal acção.”
Mariano Matsinhe era o «2M»
Paulo Oliveira fornece várias provas do seu envolvimento com o SNASP no período em que Sérgio Vieira já era ministro da segurança.
O autor do livro «Renamo: uma descida ao coração das trevas» afirma a certo passo, reportando-se à sua chegada à cidade da Beira já depois de ter voltado a Moçambique, em 1998:
“... conduzem-me à residência controlada pelo SNASP onde eu deveria ficar. A «base de operações»! É uma casa da TCT (Transport and Commodities Services), outra empresa subsidiária do SNASP tal como a «Pão Fresco». À frente da TCT nacional estava o Luís Filipe Costa, o quadro da Segurança que eu encontrara no aeroporto de Paris, à partida. Mas aqui, em Sofala, o «cabeça» provincial é o Gaspar, que me coloca perfeitamente à vontade. Alto, menos de trinta anos, este empresário simpático e falador, está sempre risonho, rosto aberto sobre um ameaço de barbicha no queixo. Não há ninguém na Segurança, claro, que não me queira conhecer, ainda por mais o «2M», o ministro Mariano Matsinhe, a frisar sempre, em reuniões, como continua a constar-me, que eu sou ´quadro´ desde 1979 em missão especial...”
Mariano de Araújo Matsinhe substitui Sérgio Vieira como ministro de segurança nos princípios de 1987. De 1975 a 1984, o SNASP foi dirigido por Jacinto Veloso e Salésio Teodoro Nalyambipano. Entre 1984 e 1987 esteve sob a alçada de Sérgio Vieira.
CANAL DE MOÇAMBIQUE - 20.07.2006