domingo, 18 de janeiro de 2015

Como o Google sabe quase tudo sobre a nossa vida

Armazenamento da informação dos utilizadores, venda de publicidade e dados, concessão de acesso a governos; o motor de busca é acusado de ser a mais perigosa das secretas

O motor de busca mais famoso do mundo está envolto numa enorme suspeição. Julian Assange, fundador da WikiLeaks, afirmou há dias num debate em que participou que o Google “é o maior serviço de informações do mundo”. “Se têm amor à vossa privacidade, larguem o Google, o Facebook e o Dropbox.” É o conselho de Edward Snowden, o ex- analista dos serviços de informações americanos que revelou milhares de documentos secretos em junho de 2013. Julian Assange, fundador da WikiLeaks, foi mais longe num debate este mês no Lisbon & Estoril Film Festival: “O Google é o maior serviço de informações do mundo.”
As várias aquisições de empresas por parte da Google fazem que esta fique na posse de inúmeros dados sobre quem utiliza a net
Em 2013, Snowden garantira que os sistemas de informação dos EUA tinham penetrado (“hackado”, no jargão da net) os servidores do Google e do Yahoo para obter informação privada de milhões de utilizadores. Como resultado, o Google anunciou que t i nha encriptado o Gmail. Mas o que Assange e Snowden dizem agora é que o perigo não vem apenas das secretas governamentais; as próprias empresas da net, com a Google à cabeça, funcionam na mesma lógica dos serviços secretos, procurando saber o máximo sobre os seus utilizadores e armazenando e conectando os dados de modo a criar perfis.
A desconfiança face ao Google, o mais popular dos motores de busca, empresa fundada em 1998 na Califórnia, EUA, atualmente com 42 162 empregados ( t odos eles acionistas), e valendo 308 mil milhões de euros, tem vindo a aumentar, com denúncias e alertas sucessivos. Em fevereiro, a revista eletrónica americana Salon publicava um artigo, intitulado “Quatro maneiras que o Google usa para destruir a privacidade e armazenar a sua informação”, em que alertava para as atividades “secretas” da empresa e para o seu poderio em expansão. Em janeiro, esta tinha comprado a Nest, uma empresa que vende si st emas de aquecimento controlados por wi- fi. “Alguém quer esta companhia dentro da sua casa?”, perguntava a Salon, citando o site PrivacySOS. org, que como o nome indica trata de questões de privacidade.
Na mesma altura o Wall Street Journal escrevia: “Esta aquisição ajuda a Google a fechar o círculo de busca, pessoas e bens numa Vasta Internet de Tudo.” E a Salon continuava: “Qualquer pessoa que queira manter um certo grau de privacidade deveria estar atento. Google tem feito muito mais do que os seus lobistas e executivos têm admitido quando defendem ou promovem as suas iniciativas. “E dá quatro exemplos: a admissão pelo Google, em março de 2013, de que os seus carros que filmam as r uas de t odo o mundo para o Google Earth fazem mais que fotografar: registam dados de computadores dentro dos edifícios; a recusa por um juiz federal, em outubro de 2013, de arquivar um processo, comvista a uma ação coletiva, de utilizadores de Gmail, com o fundamento de que este serviço de correio eletrónico do Google analisa todas as mensagens trocadas através dele para criar perfis e vender publicidade ( qualquer ut il i z ador do Gmail sabe que lhe aparecem na janela do correio eletrónico anúncios relacionados com palavras usadas nos mails). Um assunto que já em 2009 fora abordado numa audição no Congresso dos EUA, com os advogados da companhia a afirmar que esta usa a tecnologia que permite ver os mails apenas para afastar o lixo eletrónico, vírus e oferecer anúncios relacionados com o Gmail. Mas na opinião da juíza Lucy Koh o Google nunca informara os utilizadores do Gmail de que i a cr i ar perfis sobre eles para lhes dirigir publicidade específica, ou quem se corresponde com utilizadores do Gmail de que as suas mensagens iam ser alvo de escrutínio. Os exemplos restantes têm a ver com a anulação do dispositivo do browser Safari que impedia o registo do histórico pelo Google e com a captura, através dos telefones e tablets Android, das passwords de wi- fi. E, lembra a Salon, a cereja no topo do bolo dos atentados à privacidade é o l ançamento da l i nha de óculos Google Glass, que permitem filmar e gravar sem ninguém dar por isso.
Domingos Soares Farinho, jur i sta que tem f eito i nvestigação académica na área da privacidade, secunda estas preocupações. “O Google, a Amazon e o Facebook, c ombinados, t êm a nossa vi da t oda. Sabem onde f ost e, o que compraste, onde estiveste. A privacidade tal como as pessoas que nasceram até aos anos 70- 80 dos século passado a conheceram já não existe. Os miúdos que cresceram com a net não têm a mesma ideia de privacidade que alguém de 4 0 a nos te m. O máximo de acesso livre à informação está a ser pago em perda de privacidade.”
Para o jurista, a única forma segura de garantir a privacidade é “estar fora da rede”. Rui Cruz, responsável do site Tugaleaks, acha que não é preciso ir tão longe. “Por menos de 30 euros/ ano pode- se comprar um domínio com o nosso nome [ exemplo: omeunome. com] e t er uma conta de e - mail personalizada s em l i gações ao Gmail, Yahoo!, Sapo ou outros serviços centrais. Para as pesquisas, que são o maior problema, porque tudo o que fazemos na rede fica registado e indexado ao perfil do Gmail, pode- se usar um motor de pesquisa chamado DuckDuck Go( https:// duckduckgo. com), que nos permite impedir que as nossas pesquisas fiquem ao alcance de t erceiros. E não devemos t er t odos os ovos no mesmo cesto: usar uma empresa para cada serviço [ mail, calendário, ficheiros, etc.] e nunca escolher a mesma password para todos estes serviços.

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