Todo o mundo gostou do discurso do novo Presidente da República, Filipe Nyusi. Eu também gostei mas...mas o meu papel não se resume em gostar. Para mim, Nyusi foi demasiado ambicioso, de fasquia elevada como é de praxe neste tipo de inaugurações (recordam-se do Yes We Can, do Barack Obama, e tudo o que ele prometeu?). Eu preferia um discurso mais comedido e modesto, com marcas de Estadista, sim, mas com menos pretensão messiânica.
Gostei sobretudo da sua ruptura com a cartilha de Armando Guebuza, nomeadamente aquela coisa enfadonha da “luta contra o deixa andar” e a clerical “autoestima”. Gostei porque ele não atirou dardos fumegantes contra o antecessor como fez Guebuza, se bem que isso decorre da forma como ele chegou ao poder.
Gostei, mas o discurso do novo PR tem muitas coisas pouco claras. E grandes promessas. Grande promessas são traiçoeiras. Prometer combater a corrupção sob tolerância zero (usando outras palavras, como “sem condescendência”) mas sem dizer que medidas de política vai tomar, é pregar num deserto de ideias.
Sobretudo no contexto de Moçambique. Obviamente que um discurso inaugural é uma carta de princípios e não um enunciado de políticas. Por isso, esperemos pela tomada de posse do seu Governo para percebemos como é que ele vai dar conteúdo concreto a esses princípios.
Por exemplo, uma das coisa que foi mais audível (e que é recorrente em Moçambique) é a ideia que ele vincou da necessidade de robustecimento das elites empresariais para participarem na exploração dos recursos naturais. Concordo!. Contudo, não ficou claro como é que isso será feito no quadro das suas reiteradas promessas de inclusão, sobretudo quando essa inclusão é política. Por outras palavras, como é que ele vai despartidarizar os negócios do Estado (mais importante que despartidarizar a função pública) para que, como ele frisou, “os moçambicanos sejam os donos e a razão de ser da economia”, uma coisa desejável mas, quanto a mim, inalcançável a breve trecho.
Registei com agrado a promessa de transparência na gestão da indústria extractiva e a ideia da incorporação do conteúdo local, ficando para ver como é que isso vai ser concretizado. Nyusi mencionou agricultura, infraestruturas, a Saúde e tudo o que é habitual ser mencionado, mas não deu um cheirinho sobre a política económica (Ok...há um programa de Governo, mas eu esperava que ele partilhasse algumas nuances sobra a gestão macroeconómica).
Gostei do discurso, mas, lendo o texto, fica-se com a ideia de que teremos um Governo mais intervencionista, que vai resolver todos problemas e onde o sector privado e o investimento estrangeiro têm pouco espaço. Por isso, um silêncio quase que absoluto em relação ao ambiente de negócios.
Mas o silêncio mais ensurdecedor foi sobre a principal riqueza dos moçambicano: a terra. Num contexto em que a maioria dos moçambicanos vive da terra, sua principal riqueza, friso, era fundamental que o Presidente reafirmasse na inauguração que ele vai proteger os moçambicanos contra a actual vaga de expropriação e que, onde tiver que haver reassentamento em face de exploração mineral ou de implantação de infraestruturas, isso será feito com justiça. Gostei do discurso, mas o meu papel não se resume em gostar. Nele, há bons princípios que precisam de conteúdo concreto para que sintamos que estamos de facto a dar passos em frente com maior solidez. Isso não ficou ainda demonstrado.
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