sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Um governo que nos defenda

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Há 5 anos que sofrem na pele as consequências de um processo deengenharia social, digno de um capítulo do livro Shock Doctrine, de Naomi Klein. Há 5 anos que vêem governos a rodar, mas é sempre a mesma austeridade, sempre mais crise, mais pobreza. Há 5 anos que vivem no país que ninguém quer ser, mas é agora que Berlim, Bruxelas e o FMI ameaçam o povo grego inteiro com as duras consequências de um "voto errado" no dia 25 de Janeiro. Não, as eleições gregas não são um plebiscito à permanência da Grécia no EURO. Até ver, se ela acontecer, será por imposição da Alemanha e não por escolha democrática. As eleições gregas são, só e apenas, o momento em que todos nós, todos os europeus, poderemos finalmente vislumbrar uma inversão na relação de forças na Europa e acreditar que é possível resgatar a democracia da asfixia dos mercados.

Partidos xenófobos no poder e que põem em causa a liberdade de circulação. Partidos no governo que não respeitam a liberdade de imprensa ou de associação, como acontece na Hungria com a conivência de Merkel ou Passos Coelho, que acolhem Viktor Orbán na sua família política. Presidentes da Comissão responsáveis pela criação de um monstro financeiro e fiscal, o Luxemburgo (perguntem ao BES). A tudo isto Bruxelas tem fechado os olhos, perante isto tem assobiado PARA o lado. Dizem-nos que não é nada connosco, que os países são soberanos. Agora, finalmente, alguém - milhões de alguéns -, na Grécia, tem a veleidade de reclamar o óbvio - a necessidade, o direito, de renegociar uma dívida impagável que tem privilegiado credores aos direitos de sociais e de cidadania - e soam as trompetas de guerra. Os gregos podem decidir o seu futuro, desde que o seu futuro bata certo com o que foi decidido nas praças financeiras e aprovado pelos governos neoliberais, ou neoconservadores, ou sociais liberais (conforme a preferência) da Europa.

A campanha do medo é a maior recordação de como este "projecto europeu" odeia a alternativa ou a divergência.

Um em cada dois jovens gregos não tem trabalho, percentagem idêntica à de crianças que vive na pobreza. Os indicadores de saúde são arrepiantes, o número de suicídios ou doenças mentais disparou. É este o resultado de um programa de empobrecimento deliberado que, a salvo de uma retórica moralista sobre os direitos excessivos de quem viveu acima das suas posses, esconde um poderoso mecanismo de transferência de recursos dos trabalhadores PARA o capital. Os dados existentes sobre o nosso país indicam que a "crise tirou 3600 milhões de euros aos salários para dar 2600 milhões ao capital" .

É a inversão desta cada vez mais assimétrica correlação de forças entre mercados e direitos sociais, laborais e de cidadania que está em confronto na Grécia. A eurocracia e os mercados financeirostêm boas razões PARA temer as eleições gregas. São as primeiras em que a austeridade radical, que têm imposto há anos e anos em toda a Europa mas muito especialmente na sua periferia, vai a votos e - admirem-se! - pode perder. O nosso futuro e o da Europa passa, em 2015, tanto pelo que acontecer em Portugal como pelos resultados eleitorais na Espanha e Grécia.

Uma eventual vitória do Syriza pode alterar as relações de poder na Europa. Se o Syriza na oposição já inspira tanto medo, capaz de juntar Merkel, Juncker e FMI na sua condenação, imaginemos o efeito de uma voz em Bruxelas que coloque os direitos dos cidadãos, defendendo a justiça económica e social à frente dos "direitos" dos mercados. Finalmente, teremos quem fale por nós em Bruxelas, e irá fazê-lo em grego. Que orgulho.


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