quinta-feira, 19 de março de 2015

O Presidente da República, Filipe Nyusi apelou às Forças Armadas a elevar a sua prontidão combativa

Filipe Nyusi mostra face

DEPOIS DO APARENTE CALCULISMO
POR: JOSÉ ALVES
O Presidente da República, Filipe Nyusi, na sua qualidade de comandante em chefe das Forças de Defesa e Segurança(FDS) apelou semana passada às Forças Armadas a elevar a sua prontidão combativa para dentre outros deveres poderem estar à altura de responder aos que pretendem promover mudanças em Moçambique inconstitucionalmente.
Foi a primeira vez desde a tomadade posse que Filipe Nyusi se dirigiu às Forças Armadas naquela qualidade. A ordem de Nyusi que até seria normal se não fosse o actual ambiente político, ganha novos contornos ou interpretações nesta altura em que a Renamo e o seu líder, Afonso Dhlakama, reclamam, primeiro, que sejam eles a estar à frente da gestão das províncias onde obtiveram vitória no escrutínio de Outubro passado. Segundo, exigem a autonomização dessas províncias, da zona centro e norte do país.
A Frelimo que é o partido de Filipe Nyusi sempre foi contrário ao projecto da Renamo e tem evocado que o mesmo é inconstitucional, posicionamento que foi desconstruído pouco tempo depois pelo Professor Gilles Cistac que interpretou um dispositivo da própria Constituição da República que abre espaço para acomodação das pretensões da Renamo, sem ferir nenhuma das partes. Gilles Cistac acabou sendo assassinado no início do mês corrente (03 de Março de 2015) em plena manhã na cidade de Maputo, um evento relacionado pela sociedade como tendo ocorrido devido a esses posicionamentos do Professor que acomodam constitucionalmente o projecto da Renamo. Os restos mortais de Cistac foram velados na semana passada (10 de Março de 2015) seguindo depois para França para o respectivo enterro, sua terra natal. Em Maputo e Beira houve manifestações populares de repúdio ao assassinato de Cistac, actos que foram obstruídos pelas autoridades policiais. Outro dado interessante foi a ausência de quadros do partido Frelimo nas cerimónias públicas que se seguiram, em homenagem a Cistac.
A prontidão combativa contra os que pretendem implementar mudanças inconstitucionalmente é uma clara referência à Renamo e seu líder relativamente ao seu projecto de criação de províncias autónomas.
Trata-se de um projecto que ainda carece da aprovação ou não pela Assembleia da República (AR), órgão legislativo moçambicano onde o partido Frelimo forma maioria, qualidade essa que lhe confere a posse da faca e do queijo na mão quanto à decisão final. A julgar pelo posicionamento e pronunciamentos  de várias chefias do partido Frelimo, as hipóteses do projecto renamista vingar na próxima sessão ordinária da AR são escassas. A não ser que haja novos desenvolvimentos nos contactos entre as duas partes, tudo indica que o braço de ferro está em perspectiva. Entretanto, também a julgar pelos pronunciamentos de Dhlakama, a Renamo tem vindo a frisar que não vai aceitar que o seu projecto seja chumbado, “apenas por chumbar”, como tem esclarecido o líder da Renamo.
“Isso não havemos de aceitar”, tem repetido Dhlakama no seu períplo pelas províncias da região norte e centro do país onde avisa que caso tal venha suceder, “então vamos formar o governo à força”.
Trata-se de dois aspectos extremados que abrem espaço para a possibilidade de um cenário de desobediência civil liderada pela Renamo nos próximos tempos, não ficando de lado a hipótese do conflito vier a desembocar em confrontações de rua envolvendo manifestantes e agentes das FDS nessas províncias. Também não é de excluir que a situação venha piorar e terminar em escaramuças armadas entre as FDS e o braço armado da Renamo, cujos homens residuais ainda não foram desactivados no âmbito das negociações do Centro de Conferências Joaquim Chissano.
No último sábado (14 de Março de 2015) na Gorongosa, província de Sofala, Afonso Dhlakama, falando em comício popular, reiterar ser irreversível a implementação do projecto das províncias autónomas.
Já dias antes, num outro comício popular em Quelimane, Dhlakama havia esclarecido que a submissão do projecto das províncias autónomas ao Parlamento moçambicano constituía uma questão burocrática e não um pedido ao partido Frelimo.
Este posicionamento aparenta ser o lado oposto da mesma moeda da Renamo e da Frelimo nessa sua saga de luta pelo Poder. A Renamo quer implementar o projecto das províncias autónomas, custe o que custar. O Governo não garante que a bancada do seu partido na AR venha aprovar o aludido projecto.
E, finalmente, Filipe Nyusi preparasse para o que der e vier, e, vai organizando a prontidão combativa das Forças Armadas. Aliás, ao nível de Sofala, fim-de-semana passado estiveram reunidos quadros da Frelimo, e, desse encontro, mais uma vez reafirmaram que não iriam  votar nesse projecto. É este barril de pólvora apimentado por extremos que sustenta a ténue estabilidade política moçambicana assente num sistema eleitoral em que, o que ganha, ganha tudo, e, o que perde, perde tudo. Para que os que perdem possam ganhar alguma coisa, certamente, que será necessário que os que ganham tenham de perder algo a favor dos que costumam perder. Eis o que na prática significa o que a Renamo exige: Províncias autónomas, projecto que é muito improvável que a Frelimo venha apoiar.
PROVÍNCIAS AUTÓNOMAS
O projecto da Renamo decorre das irregularidades e tantas outras ilegalidades verificadas ao longo do processo eleitoral que culminou com as eleições gerais em Outubro do ano passado. Apesar de existir correntes que defendem que tais irregularidades e ilegalidades não alteraram o resultado global das eleições, para a oposição, com mais destaque para a Renamo, as mesmas consubstanciam fraude da qual os renamistas argumentam o partido Frelimo e seu candidato colheram vantagem para saírem vitoriosos. As irregularidades foram de tal sorte que as próprias autoridades eleitorais não conseguiram apresentar alguns editais referentes aos resultados, para além das reclamações dos dois partidos da oposição mais votados, Renamo e MDM, terem sido liminarmente chumbados pelas autoridades sob alegação de falta de cumprimento dos procedimentos fixados por lei para o tipo de petição que passava por reclamar localmente, onde as irregularidades ocorreram. Não foram chumbadas por falta de mérito. A habitual conotação dos órgãos eleitorais assim como do próprio Conselho Constitucional com o partido Frelimo devido, acima de tudo, à composição dos respectivos órgãos, dominada por partidários do partido no poder, alguns sob capa de sociedade civil, e outros, escudando-se na indicação pelo Governo, também não ajuda, e, pelo contrário, abre espaço para que certos sectores da sociedade estejam neste momento a dar benefício de dúvida a favor do inconformismo da Renamo.
“Que lei é essa que permite que um partido, só por ter a Polícia do seu lado pode encher as urnas e o outro partido quando vai queixar é quem vai a cadeia”, questionou há dias Dhlakama num dos seus comícios populares, deixando no ar a ideia de que as autoridades são parciais e a favor do partido Frelimo.
Dias depois do 15 de Outubro passado, após as constatações preliminares do processo de apuramento que indiciavam tantas irregularidades, algumas delas consubstanciando ilegalidades, Dhlakama veio publicamente reconhecer que havia tantos problemas, no entanto, avançou na ocasião que a única coisa que poderia constituir uma saída pacífica seria a constituição de um Governo de gestão. No meio desses enredos todos, do lado do partido Frelimo, oficialmente, não houve resposta ou reacção. Pelo contrário, à medida que os prazos eram cumpridos, logo após o pronunciamento do Conselho Constitucional que lhe deu vitória e ao seu candidato na eleição geral, a Frelimo optou por ir formando o executivo, serenamente, como se o processo eleitoral tivesse sido limpo e imaculado. Foi nomeando e conferindo posse a tudo e todos os visados a ponto da sua contraparte, a Renamo e Afonso Dhlakama, perceber que estava a ver navios a zarpar, e acabar por optar em mudar de posicionamento e, como alternativa, escolher deixar a Frelimo governar a vontade onde de facto ganhou, entretanto, colocando como condição que lhe sejam dadas competências para governar as províncias onde ganhou e, ao mesmo tempo, exigir mais autonomia financeira, relativamente ao governo central. É isto que a Frelimo não quer, nem ouvir falar sequer, de tal hipótese. Os próximos tempos dirão se Nyusi andou a fazer jogada de mestre contra Dhlakama ou não.
Mas tudo indica que o país caminha a passos largos rumo ao abismo, num cenário em que Dhlakama foi se reunindo, sucessivamente, com PR, desde Chissano, Guebuza, e agora Nyusi, sem que na prática as coisas andem de facto.
CATEMBE – 19.03.2015

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