quinta-feira, 14 de maio de 2015

MIRADOURO - Xenofobia, arma de frustrados sul-africanos (3)



MIRADOURO - Xenofobia, arma de frustrados sul-africanos (3)

Quinta, 14 Maio 2015


ORA, esta questão de casamento de um estrangeiro com uma moçambicana, ou vice-versa, quem de direito precisa “abrir” muito bem o olho, de tal sorte que fique esbugalhado. As moçambicanas, em particular, nesta situação têm sido vítimas, caem sempre no falso. Um casamento simulado, o que a lei condena.


Ninguém sabe por que motivos, as reclamações não têm sido frequentes. Um casamento fracassado, e pronto, porém, na realidade, tratou-se de um casamento aparente, não obstante se tenha consumado.


Ora, a xenofobia foi e é um problema que as autoridades públicas sul-africanas não deviam ter tratado de ânimo leve. Dizia o carismático da pátria moçambicana, Samora Moisés Machel, que a cobra matava-se enquanto ainda uma cobrazita, pois, depois de crescida, seria muito difícil matá-la. A verdade manda dizer que não se trata de um sentimento generalizado do povo da África do Sul, mas um adágio popular, por outro lado, manda dizer, à maneira dos brancos, “é de pequeno que se torce o pepino”. Aquando da primeira eclosão daquele fenómeno social, em 2008, quem de direito devia ter pensado como, logo à partida, “matar a cobra ainda pequena”.


E a situação atribulada ganhou contornos motivadores, recentemente, depois daquele discurso de incitação proferido por um influente lá da terra de Nelson Mandela, o rei dos zulus, Zwelthini. Há quem quando diz algo o mundo acredita e fica de olho aberto. O dito por não dito de nada valeu. E foi uma vergonha para o rei zulu não ter sido cumprimentado por Robert Mugabe. Uma “surra” tremenda em que aquele rei devia amaldiçoar o dia em que nasceu. Dizia eu que não se trata de um sentimento popular, mas não deixa de ser uma manifestação de alguns frustrados sul-africanos, que não são poucos. Os discursos que se seguiram, depois de o mal ter eclodido, de nada valeram. Quem não entendeu que a liderança pública sul-africana não tomou conta do recado? Por aquilo que se viu, os moçambicanos eram o alvo principal, prejudicados, sobremaneira, pela língua que não se articula como devia ser. Nós, com a humildade que nos caracteriza, engolimos em seco. Diz-se que a cobra-mamba não morde, todavia, mesmo que fosse em jeito de “massingita”, a mamba devia ter mordido. Fiquei amuado quando alguém, de viva voz, veio a terreiro dar conta de que a força de repulsa, cá entre nós, devia ser branda, para “não afectar, negativamente, as nossas relações comerciais com a África do Sul”. Ora essa, porque somos tão mendigos que qualquer outra espécie humana? Alguém pode cuspir-nos na cara e depois nos dá uma fatia de pão, recebemo-la, porque não as temos? Falou-se e fala-se tanto de auto-estima, como, na prática, manifestamos isso? Um falso “slogan”? Se o pobre não zanga, nada diz que é por ele não saber zangar. Alguém cospe-nos na cara e nós agradecemos com um sorriso risonho! Nada disso. Ninguém diz que seria em jeito de ripostar, “de devolver o mal por mal, que o Código de Hamurabi” cá não funciona, contudo, a reacção foi quase que pouco clarividente para quem esteve atento. E se se repetiu o fenómeno, foi porque em 2008 as desculpas foram apenas formais. Nada foi veemente. Gente foi molestada, gente morreu como se se tratasse de bichos, e tudo ficou nos gabinetes diplomáticos, “para não estragarmos as nossas relações comerciais”. Se o vizinho não se escolhe, não é sinónimo de o deixar agir como bem entender. Às vezes, as comadres viram-se as costas e não se falam, ao varrerem o quintal.


Arlindo Oliveira

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