sexta-feira, 15 de maio de 2015

Os eleitos (ou o direito divino)

INTERVENÇÃO - Os eleitos (ou o direito divino)
Sexta, 15 Maio 2015

A CRISE no Burundi, ou melhor a causa da crise, deu para deter o olhar sobre a nossa África. E o que vejo? Uma velha página da história do continente que, não devendo ser esquecida, está a ser virada, mas que alguns insistem em mantê-la aberta.
Tivemos um período em África que os líderes se impunham no poder e dirigiam até à morte, caso não fossem de lá afastados pela força das armas. A alternância do poder era ditada pela morte ou por um golpe de Estado. Veio a nova era, aprendemos a democracia. Abdicámos da ideia de que os dirigentes eram para a eternidade e passámos a votar na esperança. Foi uma esperança morta. Nem os velhos dirigentes, transmutados em democratas, nem os novos, promessas da idade moderna, renunciam à ideia de se colocarem amarras quando chegam ao poder. Foi assim no Burkina Faso e é assim, agora, no Burundi e sinais idênticos se notam no Congo-Kinshasa, no Congo-Brazzaville, falando apenas de casos recentes ou de um futuro próximo. Qualquer que seja o desfecho da actual situação de golpe no Burundi, retida fica a mesma ideia: o apego dos governantes africanos ao poder. Eleitos pelo povo, transformam-se depois em eleitos divinos. Por fé, por ego ou por ambição, pretendem-se predestinados para o cargo e reclamam o dever etéreo de conduzir o país. Mas estamos todos conscientes que nenhum indivíduo, nenhum partido, tem o direito divino de governar um país, um povo.
J. MACHADO

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