Acabou a farsa: a Venezuela caminha para o caos económico e a resposta dos socialistas para a crise é a ditadura. Mais uma vez a esquerda radical mostra que a sua “liberdade” é conquistada à custa das liberdades dos outros.
Sessão solene na Assembleia Nacional da Venezuela, o parlamento fantoche daquele país latino-americano: os deputados do Partido Socialista Unido, leais servos do “chavismo”, aprovam a Lei Habilitante dando ao Presidente Nicolás Maduro o poder de governar por decreto, sem consultar o parlamento ou os tribunais. Já não há como esconder: a ”República Bolivariana” é apenas mais uma ditadura socialista como a que existe em Cuba.
Pensaria uma pessoa razoável que a Lei Habilitante se destinaria a ajudar Maduro a poupar a economia da Venezuela à queda iminente no abismo da miséria, ou pelo menos a controlar o caos nas ruas e a violência que aterroriza o povo. Mas não: Maduro exigiu estes poderes extraordinários para lidar com “a ameaça” dos Estados Unidos. Esta não é a primeira vez que o regime venezuelano usa bodes expiatórios para reforçar os seus poderes.
No discurso infantil e irresponsável dos “chavistas”, a culpa dos seus inúmeros fracassos nunca reside em si ou nas suas políticas, mas sempre em terceiros. Segundo a retórica propagandística dos líderes supremos da Venezuela, trata-se agora de uma “guerra económica contra o povo”, a que o regime “bolivariano” responde com a ditadura.
Este tipo de teorias ocas da conspiração é uma herança dos velhos tempos do bloco soviético, quandso havia sempre um “plano obscuro” do “capitalismo imperialista” que impedia o “paraíso dos trabalhadores” de se tornar realidade.
Na Alemanha de Leste, um cidadão tinha de esperar 10 anos para receber um carro, e sempre que se perguntava (em surdina, claro) porque é que os ocidentais tinham carros novos, entregues na hora, que custavam metade do preço, a resposta oficial era sempre a mesma: havia sabotadores a impedir a “batalha da produção”.
Quando confrontado com a escassez de quase todos os bens essenciais nas lojas, Maduro não reconheceu o óbvio, que a responsabilidade só podia ser assacada à sua péssima política macroeconómica, e atacou os “sabotadores económicos”. A campanha de ‘marketing’ para “mobilização das massas”, ao pior estilo pseudo-patriótico, lembrou um filme de acção de má qualidade de Hollywood, com os militares venezuelanos em cima de carros de combate, espingarda de assalto em punho, a fazerem plantão em frente às lojas, onde não deixaram os donos entrar.
Maduro decidiu então expropriar, com pompa e circunstância socialista, os supermercados. O resultado desta política? O que antes era alguma escassez tornou-se mesmo ausência total de tudo.
Burocracia sufocante
OLYMPUS DIGITAL CAMERAHá algumas semanas, um fabricante de massas alimentares contou a uma rádio norte-americana como funciona o processo burocrático para se produzir seja o que for. Para começar, metade da produção tem que ser vendida aos “pobres” a um preço fixado pelo Estado. Como os preços não podem ser actualizados a tempo por causa da inflação galopante, não é raro os produtores terem de vender com prejuízo.
Caso a matéria-prima de um determinado produto não exista no país, então está o caldo entornado: o empresário privado tem de pedir autorização de importação a 19 ministérios diferentes, muitos dos quais com responsabilidades que se sobrepõem.
Como é comum nos sistemas socialistas, a corrupção é generalizada, não espantando ninguém quando se descobriu, graças ao escândalo “swissleaks”, que havia mais venezuelanos do que norte-americanos com contas bancárias secretas na Suíça. Aliás, o antigo guarda-costas de Chávez, que depois se tornou ministro das Finanças, vive hoje na Flórida, rodeado de luxo, enquanto o “seu” povo passa fome. Imperialistas “yankees” num dia, vizinhos no outro.
Maduro pertence ao núcleo duro da oligarquia socialista e sabe que, se liberalizar a economia, ou se começar a combater a corrupção, será derrubado. Logo, a táctica é gritar mais alto, inventar inimigos e esperar que a situação melhore antes que os venezuelanos se fartem de vez dos “bolivaristas”.
Caos económico
Em Janeiro deste ano, a lista de produtos correntes que os venezuelanos não encontravam nas lojas incluía já papel higiénico, pasta e escova de dentes, fraldas, produtos de higiene feminina, carne, ovos, papel, pilhas, queijo, leite, vinho, cerveja, refrigerantes, aspirinas, azeite, óleo de cozinhar, massa….
Aliás, seria mais fácil enumerar o que de facto se pode comprar na Venezuela. Até há pouco, ainda era possível adquirir gasolina a preço de desconto. Mas até os combustíveis foram racionados, porque muitos venezuelanos, em desespero, começaram a vender gasolina na fronteira em troca de bens essenciais.
O problema, aliás, reside exactamente no petróleo. Nos tempos “dourados” de Chávez, o governo podia compensar a sua loucura com o dinheiro da venda deste recurso, do qual a Venezuela é um dos maiores produtores mundiais. Desde 2001 que o valor do petróleo se mantinha elevado, chegando a superar os 120 dólares por barril. Mas à data de fecho desta edição o valor do petróleo descera já aos 44 dólares, e a perspectiva é de continuar em queda.
As exportações foram cortadas em 70%, e o país, tal como outros petro-impérios como Angola, viu-se subitamente sem reservas de dinheiro “a sério”, moeda forte aceite pelos parceiros comerciais. A maioria das empresas internacionais tem dificuldade em aceitar o “bolivar fuerte”, cujo valor cai de dia para dia.
Regresso ao passado
A cena parece saída da URSS: os venezuelanos têm de esperar horas intermináveis em filas, à espera de mais uma distribuição de alimentos. As explicações oficiais são caricatas. O presidente do Instituto Nacional de Estatística (um órgão completamente politizado, sem qualquer credibilidade técnica) chegou, num momento digno dos “Monty Python”, a afirmar que a comida escasseava porque “as pessoas comem demais, às vezes três e quatro vezes por dia”.
E, no entanto, crianças desmaiam todos os dias nas escolas por falta de alimento: a fome assola a Venezuela.
A espera nas filas é desesperante e de uma flagrante desumanidade. Uma mulher grávida perdeu o filho por ter ficado quase um dia inteiro de pé, ao sol. Não são poucos os idosos que morrem nas filas à espera de poderem comer alguma coisa, outros morrem por os medicamentos de que precisam não estarem disponíveis. Enquanto os serviços funerários não os vêm buscar, as pessoas continuam em espera na fila, ao lado dos caídos, uma cena que lembra a Ucrânia socialista, onde as pessoas continuavam o seu dia-a-dia ao lado de corpos nas ruas. A fome humilhante sempre foi amiga dos regimes comunistas.
A resposta de Maduro foi novamente idiota: racionamento, mas racionamento “high tech”, com um sistema de identificação com leitor de impressão digital, como existe nos telemóveis mais modernos. Como seria de esperar, o sistema não funciona e causou ainda mais demoras, pois avaria constantemente e não existem técnicos suficientes para o consertar. Quem sabe se o sistema não foi concebido pelos computadores “Magalhães”, que a Venezuela comprou e nunca pagou ao Estado português…
No mercado negro, tudo se vende a preços mirabolantes, dada a imensa procura: um pacote de açúcar pode chegar ao equivalente a 200 euros, e papel higiénico é caro demais para a maioria. Os jornais têm esgotado nas bancas, mas suspeita-se que não têm sido lidos…
Quem tem medo da oposição?
PROTEST_REASONS_signEstão marcadas eleições legislativas para o final deste ano, e tudo indica que o partido reinante não teria capacidade para as vencer, caso as disputasse de forma livre.
A oposição, desta vez, está reunida em volta da coligação “Mesa de la Unidad Democrática” em vez de fragmentada como em outros anos. Caso não consiga vencer uma maioria no parlamento, o futuro de Maduro está decidido, visto que esta assembleia pode exigir eleições presidenciais antecipadas, que Maduro não conseguirá vencer.
Os poderes extraordinários, no entanto, significam que essas eleições poderão não se realizar, pois Maduro detém o poder de unilateralmente suspender a Assembleia. Já em 2014, depois da onda de revoltas que abalou o país, Maduro deu ordens para prender vários líderes da oposição, até mesmo figuras que não se envolveram nos protestos. Os novos poderes especiais de Maduro dão-lhe autoridade para fazer ainda mais detenções extra-judiciais. E não tardará que as prisões do país voltem a ficar cheias com os dissidentes do regime, que, segundo a retórica local, são “agentes infiltrados do regime yankee”.
E, por isso, a luta continua, até ao colapso final.

Portugueses em perigo

A comunidade portuguesa na Venezuela é muito numerosa: mais de um milhão de pessoas, a maior comunidade lusófona na América Latina a seguir ao Brasil. A emigração para a Venezuela tem sido constante desde o século XIX, mas os emigrantes e luso-descendentes mantiveram fortes ligações com a pátria lusitana, e as suas remessas encheram durante muitos anos os cofres dos nossos bancos e do nosso Estado.
Muitos dos emigrantes portugueses são pequenos e médios empresários, nomeadamente na área da hotelaria, da construção civil e da alimentação, e as recentes medidas “socializantes” resultaram na perseguição de muitos deles por parte das autoridades, que querem, em muitos casos, expropriar o seu património. Os empresários da área da alimentação têm sido os que mais têm sofrido. Numa reportagem publicada pelo ‘Jornal de Notícias’ antes das eleições presidenciais de 2013, todos os entrevistados afirmaram que iam votar na oposição. Um dos emigrantes referiu mesmo que “a política dos últimos 14 anos foi populista e manteve as pessoas sem trabalhar” e que “a ideia de que Chávez tirou aos ricos para dar aos pobres é mentira. Os ricos estão cada vez mais ricos”. Agora que a oposição se encontra “semi-proibida”, milhares de portugueses correm risco de se tornarem presos políticos de um regime cada vez mais autoritário.
Da parte de Portugal ainda pouco se ouviu. Só o PCP se manifestou, mas para se solidarizar com a “luta anti-imperialista” da ditadura de Maduro. Portugal é um dos principais aliados dos Estados Unidos da América, cuja paciência com o regime de Caracas está a acabar. Que pensará o Governo português fazer para proteger os nossos compatriotas.