sábado, 31 de outubro de 2015

Encobrir a falsidade em que se vive é um perigo

Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
A xenofobia na África do Sul destapou-se quando menos se esperava.
Nada tem a ver com invenções ou teorias de conspiração sobre factos não consubstanciados ou alguma que se pareça.
Durante muitos foi habituado e inculcado aos moçambicanos que uma simples directiva partidária resolvia problemas e trazia soluções.
No auge do regime do comissariado político, as orientações que a sociedade devia esperar dos missão de acompanhamento e supervisão criada pelo Governo para os próximos 30 anos.
Para além da agricultura, foram definidos os sectores da exploração mineira e da energia como sendo os que apresentam maiores vantagens.
Segundo Roberto Albino, directores pensantes e senhores do poder chegaram a apagar do mapa visível questões de natureza étnica ou racial. A verdade era obstruída por comandos partidários condenando isto ou aquilo. Vivia-se uma realidade falseada que impunha algo que as pessoas não sentiam.
De um entusiasmo efémero galvanizado pela euforia independentista não demorou que todos se dessem conta de que haviam caído no logro elaborado e injectado em doses sucessivas por um laboratório ideológico chamado Departamento de Informação e Propaganda da Frelimo.
As convulsões sociais são recorrentes onde as mesmas não são tratadas de maneira firme e aberta.
De pouco vale esconder que temos problemas de percepção e de valores.
Um dos maiores problemas é acreditar que só por dizermos que algo não existe basta que isso se transforme em realidade.
Viver encobrindo é um erro de avaliação ou de posicionamento que acarreta consequências.
Não há fantasmas do passado mas simplesmente problemas concretos do passado que nos negámos a resolver atempadamente.
Tudo vem a propósito das posturas que segmentos importantes da sociedade assumem no seu quotidiano.
Uns dizem que se deve fazer tudo para desarmar uma das partes como se isso fosse a solução para a criação de um exército nacional apartidário.
Outros dizem que o AGP assinado em Roma foi integralmente cumprindo e o seu articulado inscrito na CRM. Outros defendem que foram enganados sucessivamente.
Protelar, encobrir, fintar e outras manobras do tipo “tapar o Sol com a peneira” tem efeitos de muito curto prazo.
Volta e meia as feridas reabrem-se, e as pessoas dão-se conta de que a verdade é outra.
Não pode haver “unidade nacional” através da imposição e da manifestação constante de direitos especiais para uns cidadãos e somente deveres para a maioria.
Os desequilíbrios sociopolíticos existentes, que se manifestam pelo aumento do fosso entre os que têm e podem e os que quase nada têm, contrariam o discurso oficial de luta contra a pobreza. O que tem aumentado ao longo destes anos é a riqueza dos ricos. E é uma categoria especial de ricos, pois ascendem a esta categoria simplesmente por que estão em cargos de chefia ministeriais e outros. A coloração do cartão de membro de partido joga um papel essencial neste processo.
Montadas assim as peças para a construção de um edifício desigual e injusto, é de esperar que os resultados sejam correspondentes.
Quando se fala em “barril de pólvora em que está sentado o país”, pode parecer retórica barata, mas não deixa de ser a pura verdade.
O desenlace de qualquer solução adoptada vai ser aquilo que os actores políticos conseguirem construir.
Há nuvens negras no horizonte devido à relutância de alguns actores admitirem que Moçambique precisa de compartilhado.
Vender passaportes não pode ser caminho para o enriquecimento.
Comprar arroz doado do Japão e depois vendê-lo a preços especulativos ao abrigo de esquemas de “procurement” abertamente viciados não pode ser a via para “empoderamento” económico negro, amarelo ou de qualquer outra cor.
O país não embora oficialmente se diga que estamos num bom caminho.
Quando o líder do maior partido da oposição é atacado e o PR não fala do assunto, aumentam as razões para se estar preocupado e para duvidar da seriedade do Governo em relação ao seu discurso oficial. E se isto acontece num processo que é de rejeição das suas reivindicações quanto à validade dos resultados eleitorais homologados mais assenta a ideia de que querem resolver um político por vias não convencionais.
Quando o maior problema ou maior pretensão do país, a PAZ, é preterido e em seu lugar se opta por passeatas alegadamente diplomáticas pode ser uma questão de prioridade agenda, mas pode-se dar o caso de que se pretende fortificar a possibilidade de resolver diferendos nacionais com auxílio internacional.
As linhas com que se cose a coesão social no país estão declaradamente gastas, envelhecidas e prestes a romperem-se ao primeiro esticão.
E a forma como isso será é uma incógnita completa.
Mas ninguém tenha ilusões, pois haverá todo o tipo de oportunismo, barbárie e violência.
Compatriotas, dar oportunidade à paz requer mais do que discursos dos nossos políticos. Há que assumirmos a paz como valor máximo, mas essa paz não é e jamais será algo que alguém imponha aos outros. Nem tudo o que eu quero corresponde ao que meu vizinho quer. Mas isso não classifica um como moçambicano de pleno direito e outro de apátrida.
E os moçambicanos precisam de estar juntos no sofrimento e na bonança. Cada um fazendo aquilo que pode segundo a sua experiência, saber e recursos.
Pertencer a esta família moçambicana significa dar o corpo ao manifesto quando assim se revela necessário.
Não é oferecendo banquetes aos expoentes máximos da nomenclatura dominante que se ganha o estatuto de moçambicano. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 30.10.2015

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