domingo, 7 de fevereiro de 2016

“4. Leo Milas e os acontecimentos de M’telela”

Estudos
“4. Leo Milas e os acontecimentos de M’telela”
Em Outubro de 1976, Seifulaziz Leo Milas, ex- secretário para a defesa e segurança da FRELIMO, intercedeu junto das autoridades quenianas para impedir o repatriamento forçado de um grupo de exilados políticos moçambicanos a residir no Quénia desde 1967. O repatriamento havia sido recomendado pelo ACNUR, apesar das Nações Unidas estarem ao par do destino dado a dezenas de dissidentes moçambicanos - em Nachingweya, na Machava, e nos chamados «centros de reeducação» de Cabo Delgado e Niassa. Um ACNUR que também tinha já conhecimento do rapto do Padre Mateus Gwenjere, ocorrido em Nairobi um ano antes.
Felizmente, Jomo Kenyatta não vergou, desta vez, perante as diligências do ACNUR em Nairobi para que fosse retirado o estatuto de refugiado a esses cidadãos moçambicanos, que afortunadamente não engrossariam a lista dos Mártires de M’telela.
Mas esse não seria o destino de mais de 3000 moçambicanos, que até Outubro de 1976, haviam sido desterrados para a vizinha Tanzania afim de serem «reeducados» no sistema comunal Ujamaa e, possivelmente, reencaminhados para Moçambique, onde muitos seriam dados como desaparecidos.
Esta terá sido uma das raras intervenções públicas e talvez das mais importantes de Leo Milas na situação de Moçambique, desde a sua expulsão da FRELIMO em Agosto de 1964, acusado de ser um impostor de verdadeiro nome Clinton Aldridge, cidadão norte-americano, que se juntara a causa libertária moçambicana cumprindo uma missão da Agência de Espionagem dos EUA (CIA).
Em boa verdade, novos elementos hoje fazem-nos crer que o papel de Milas nos primórdios da FRELIMO se poderia equiparar, se a sua linha política tivesse triunfado em 1975, aos do norte-americano Morgan e argentino Che Guevara em Cuba, ou aos do indiano Aquino de Bragança, do português Leite de Vasconcelos ou do angolano José Júlio de Andrade em Moçambique, que abraçaram por motivos ideológicos, a causa dos movimentos de libertação desses países, tendo lhes sido outorgada a nacionalidade como reconhecimento do seu contributo.
Tido como «homem de mão» de Eduardo Mondlane para se desembaraçar de David Mabunda, Adelino Gwambe, Paulo Gumane e outros membros influentes da direcção da FRELIMO após o I Congresso de 1962, esteve também na chefia do primeiro destacamento de guerrilheiros da FRELIMO treinado na Argélia nesse ano.
De acordo com a sua ex-noiva, Shannon Moeser, Milas recebeu de Eduardo Mondlane, em Janeiro 1964 e em circunstâncias que ainda hoje são objecto de estudo em várias academias estrangeiras, a incumbência de realizar uma missão do mais alto nível, possivelmente de angariação de fundos para a FRELIMO, em países árabes.
Foi impedido de regressar a Dar-Es-Salaam, por imposição do próprio Mondlane, que a partir de Março de 1964 iniciou um processo interno de destituição que culminaria com a sua expulsão em Agosto do mesmo ano, provocando uma emotiva conferência de imprensa de Milas em Addis-Abeba, que acusou Mondlane, entre vários, de ser um líder ausente, que passava a maior parte do tempo nos EUA a dar aulas ou a viver em belas mansões, enquanto os seus homens penavam de fome nos campos de treino.
Afastado da política activa desde o final dos anos 60, Seifulaziz Leo Milas iniciou uma longa e promissora carreira universitária em academias da África Oriental, sendo da sua lavra vasta publicação científica, mantendo também presença habitual em programas de especialidade nos média locais até ao ano 2013.
Leitura recomendada:
5- Southern African Political History – A Chronology of Key Political Events from Independence to Mid-1997, Jacqueline Audrey Kalley et all, Greenwood Press (1999)
9- Mural de Vassili Vassiliev (com a devida vénia)
Fotografia de Leo Milas, então dirigente da FRELIMO, (o homem alto à esquerda) retirada da Obra “Memórias de Um Rebelde” de António Disse Zengazenga (2015)

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