quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

A esperança está no povo!

Este é o último editorial que escrevemos aos nossos estimados leitores no ano de 2015. Quando o jornal estiver nas mãos do estimado leitor, faltarão escassas horas para os sinos anunciarem o Ano Novo.
O ano que termina editorialmente foi rico em acontecimentos, mas foram acontecimentos que, na sua esmagadora maioria, não orgulharam a nenhum cidadão de bom senso. Foi um ano difícil, por isso, para não esquecer. Não podemos esquecer os erros crassos que foram sendo cometidos, porque corremos risco de tornar o patológico em normal, e caminharmos de mediocridade em mediocridade. É preciso romper.
O ano que termina começa agitado, com um golpe eleitoral igual ao de 1999 e com a entronização, mais uma vez, dos ladrões de votos, consagrados vencedores numas eleições porcas, que deviam envergonhar a qualquer um. Fomos obrigados a assistir a um degradante espectáculo dos agentes da golpada, com uns a culparem os outros sobre o paradeiro dos editais, que, até hoje, nunca ninguém viu. Nem o próprio Nyusi sabe como ganhou, e, se calhar, é por isso que, até hoje, não sabe se está a governar ou se está a ser governado. É o coeficiente material da ilegitimidade.
Somos obrigados a assistir a um aposentado como Chipande, sem indicação oficial qualquer, vir a público ditar as pedras angulares da governação, como se ele fosse o encarregado de educação do “menino presidente”, ou seja, dão-nos a entender que tudo o que Nyusi diz não passa de brincadeira, e que só deve ser tomado a sério se Chipande o disser. Enquanto Chipande não disser, então não é para levar em consideração.

Dias depois da legalização da golpada eleitoral, somos colhidos por um discurso de tomada de posse gordo em intenções falsas, que só precisou de 24 horas para que o seu prazo de validade expirasse. Em menos de 24 horas depois de ter sido anunciado que seria formado um Governo competente e de todos os moçambicanos, eis que são chamados amigos, cunhados, filhas de antigos colegas, sobrinhas de antigos credores, moços que tramitavam expediente na campanha e, para não desiludir, as habituais amigas que foram úteis em várias de frentes de ocasião.
Estava claro que não se podia esperar mais nada senão o habitual “chegou a nossa hora de comer”. E é o que se vê. Não há qualquer iniciativa que dê esperança ao povo, e muito menos projectos colectivos de construção da República. Um deserto de ideias, com cortes de fitas em mercados e inauguração de máquinas de escamar peixe.
E como estamos perante a extensão da saga destruidora do bando anterior, não há qualquer interesse em esclarecer crimes financeiros como o da EMATUM, que lançaram o país para o fundo do poço. Aliás, seria o mesmo que pedir a um estuprador para escolher a sua moldura penal.
Resultado: sem responsabilização exemplar, fomos reportando casos graves de desvio de fundos públicos sem que nada acontecesse aos prevaricadores. Casos como o da EMOSE são a antecâmara do que acontece em quase todas as empresas públicas, onde a noção de bem público foi apagada. O primeiro-ministro visitou todas essas empresas e constatou tal realidade, e a única medida que foi tomada foi colocar os gestores a auto-regularem-se.
Os episódios de guerra civil atingiram níveis extremos. Morreram inocentes. Houve cidadãos deslocados em desespero. Escolas e postos médicos foram encerrados. Alunos não foram examinados. O chefe do maior partido da oposição vive escondido nas matas, porque anda a ser caçado pelos homens armados do partido no poder.
Simulam-se negociações políticas e escolhe-se como mediadores os sectores mais degradados da sociedade. Estamos a entrar para o Ano Novo sem qualquer perspectiva de paz, reconciliação e tolerância. A nível económico, as perspectivas são as mesmas. Verifica-se a generalização da subida de preços, com o metical a decair para níveis nunca antes vistos. A opção por projectos duvidosos arrastou-nos até este ponto: projectos como a EMATUM não diferem do novo e milionário edifício do Banco de Moçambique, cuja finalidade até aqui ninguém conhece.
Tudo isto acontece porque, como povo, temos estado a adoptar uma postura de assustadora apatia perante os abusos que são cometidos. Com falta de engajamento cívico dos jovens, aos que governam não resta mais nada senão emitir um certificado autenticado de imbecilidade colectiva. Há que ter coragem e dizer “não”, quando é necessário. Ninguém irá respeitar o povo, enquanto o povo não assumir o seu papel de dono e patrão desta terra. Os dirigentes estão para servir ao povo, e não para serem chefes do povo. Se a consciência cívica de cada moçambicano despertar, teremos um Ano Novo de 2016 de mais esperança, porque a esperança vem do próprio povo. Ninguém melhor do que o próprio povo para decidir as suas prioridades. Gostaríamos de terminar esta reflexão desejando Festas Felizes e um Próspero Ano Novo, mas preferimos concluir exigindo mais consciência cívica de participação em 2016. Voltaremos a encontrar-nos aqui, neste mesmo espaço, daqui a sete dias, quando for 6 de Janeiro de 2016, ou seja, no Ano Novo. 
A luta continua. 
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 30.12.2015

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