terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Sobre o imperativo de conhecermos a nossa história


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CARTA A MUITOS AMIGOS
Há que conhecermos a nossa História, as figuras que a marcaram, os Homens que serviram a Pátria, a África, o mundo.
Este mês de Janeiro está prenhe de gentes fundamentais que durante este mês nasceram, faleceram, vários assassinados.
Lembremos nomes:
1.   Malangatana faleceu a 5 de Janeiro de 2011 com 75 anos. Mestre notável na pintura, muita gente formou, as suas obras encontram-se na mais importantes galerias do mundo. Porque meu amigo mandava-me bilhetes sempre com um desenho. Guardo-os com carinho e emoldurados. Fez questão de ficar para sempre em Matalane, um espaço cultural esplêndido que havia criado, quando se pensava instalá-lo na Praça dos Heróis. Algo similar ao Mestre escultor Chissano que também quis repousar no espaço que criara na Matola.
2.   Coincidentemente a 6 de Janeiro em anos bem diferentes nasceram Fernando Ganhão e Aquino de Bragança.
3.   Estudante nos finais dos anos 50 em Portugal. ligou-se ao trabalho clandestino, ficou escondido em casas diversas até que em Janeiro de 1962 conseguiu com a ajuda dos Partidos Comunistas de Portugal e Espanha chegar à França. Ganhão atravessara a pé os Pirenéus em pleno inverno, chegou com as pernas e os pés queimados pelo frio. Recolhemos e tratamos dele.
4.   Na crise de 1968 os racistas na FRELIMO com apoios de algumas autoridades da Tanzânia fizeram questão de o expulsar de Dar-Es-Salaam onde leccionava na nossa escola, o Instituto Moçambicano. Mondlane conseguiu uma bolsa de estudo na Polónia. Ganhão graduou-se com distinção.
5.   Em finais de 1974 a FRELIMO nomeou Ganhão para Reitor da Universidade de Lourenço Marques que recriou como Universidade Eduardo Mondlane. Nesse tempo não havia mais que uma vintena de estudantes e nenhum docente não branco. Vejam o trabalho realizado. Faleceu de doença em 2008. No bairro dos Cronistas em Maputo há uma rua com o seu nome.
6.   Aquino Bragança nos meados dos anos quarenta junta-se a camaradas das várias colónias portuguesas e contribuiu para o incremento da causa nacionalista. Com Marcelino dos Santos sai de Portugal e gradua-se em Química (!!!) numa Universidade francesa, Grenoble.
7.   Dedicou-se ao jornalismo, conhecia, entrevistava toda a gente, publicava nos mais diversos periódicos.
8.   Depois da independência com o apoio de Fernando Ganhão criou o Centro de Estudos Africanos na UEM. Houve aí um atentado com uma carta bomba do apartheid em Agosto de 1982. A investigadora e activista sul-africana Ruth First morreu, Aquino sobreviveu ferido. O seu marido Joe Slovo, comandante no ANC e dirigente também partiu neste dia.
9.   Aquino virá a morrer, com Samora, no atentado contra o avião presidencial em 19 de Outubro de 1986 em Mbuzini.
10.      Um pequeno monumento no Centro de Estudos Africanos assinala os nomes de Ruth First e Aquino de Bragança vítimas do ódio do apartheid contra as causas da liberdade, democracia e igualdade racial.
11.      A 17 de Janeiro de 1960 a mando das empresas mineiras e com o apoio de Mobuto, Lumumba e seus companheiros são assassinados no Katanga de Tshombé pelas tropas belgas. Apenas com 36 anos. No Parlamento belga faz alguns anos, denunciou-se a cumplicidade do monarca anterior neste crime. Em Maputo há uma avenida com o seu nome.
12.      A 20 de Janeiro de 1973 Inocêncio Cami, a mando de Spínola assassina Amílcar Cabral. Tenta fugir para a Guiné-Bissau, mas a marinha e força aérea de Sekou Touré interceptaram. Foi julgado pelo PAIGC, condenado e executado. Tinha Cabral 49 anos, vítima do colonialismo aliado a tribalistas e regionalistas nas fileiras do partido. Até hoje esses males assolam a Guiné-Bissau. Em Maputo uma rua enaltece a memória desde grande combatente da causa da libertação das colónias portuguesas, companheiro e amigo de Mondlane, Agostinho Neto, Marcelino dos Santos e outros.
13.      A 21 de Janeiro de 1924 faleceu de doença com 54 anos o grande revolucionário Vladimir Ilitch Lenine. Inspirador e dirigente da III Internacional, da Internacional dos Povos do Oriente, obreiro da luta e vitória da revolução bolchevique, até hoje muitos dos seus ensinamentos inspiram. Há uma avenida em Maputo com o seu nome.          
No nosso ensino, desde a escola primária, às secundárias e universidades deveríamos conhecer a vida e obra dos mortos na Praça dos Heróis e noutros locais.
Quem sabe a História da Josina, de Mondlane, de Samora, de Craveirinha, de José Moiane, Oswaldo Tazama que, entre outros jazem monumento onde regularmente se vão depor coroas de flores?
Também existem muitos vivos, Marcelino dos Santos, Chipande, Tomé Eduardo, Hama Thay, Pachinuapa, Gói-Gói, Salésio Teodoro, Américo Mpfumo, Lagos Lidimo, Ntumuke, Munhepe, João Pelembe, Roho Moja, Mangueira, Mataruca, Veloso, Óscar Monteiro, Joaquim Chissano, médicos como Fernanda Machungo, Pascoal Mocumbi, clandestinos como Rui Baltazar, José Luís Cabaço, Mário Machungo, Eneias Comiche? Salomão Mungwambe. Quem fundou e fez crescer o nosso estado nascido em 1975?
Devemos aguardar pelo dia do funeral para nos lembrarmos deles?
Na escola primária, o ensino ordenado pela dita metrópole e pela Igreja portuguesa até nos obrigavam a aprender as querelas de Afonso Henriques com a mãe Dona Urraca, os milagres de Santa Isabel esposa do rei D. Diniz, todas as dinastias e suas ramificações, as maldades da ocupação espanhola.
Devemos ter vergonha de nos conhecermos, de onde viemos, os que resistiram à conquista colonial, Mataca, Namarróis, Gungunhane, os Barués, os que lutaram pela ideia de Moçambique livre, quem conhece a história do Brado Africano e dos irmãos Albasini?
Tal e qual nos manuais de literatura, de onde quase todos os nossos escritores estão ausentes, tal como os brasileiros, angolanos, são-tomenses, cabo-verdianos. Dominam os manuais os escritores portugueses do século XIX mas um Saramago, único de língua portuguesa a receber o Nobel da Literatura, totalmente ausente.
Queremos ensinar o quê às novas gerações?
Suplico ao Ministério da Educação para que nos nossos estabelecimentos de ensino se conheça as nossas raízes, quanto mais profundas esta torna-se mais difícil arrancar-se a árvore da moçambicanidade com os mais variados temporais que nos assolam. Por esta causa um abraço.    
P.S. O Vice-Presidente cessante dos Estados Unidos aconselhou o Presidente eleito e que tomará posse muito em breve a tornar-se adulto.
Escutará ele o conselho para o bem de todos? Espero, mas duvido.
SV

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